Domingo, 15.09.13
Coragem
É preciso arranjar outros
motivos
outras flores e astros
Outras abertas
Entre a chuva cansada de um Outono
que não sabe já
qual é a terra certa
É preciso pensar outras imagens
outras fissuras, sítios
e cidades
Pôr fim ao lamento deste vento
tentar tirar ao anjo
a túnica e o sabre
É preciso inventar outras paisagens
outros montes e águas
outras margens
Abrir e expor o coração
e finalmente deixar
correr as lágrimas.
Maria Teresa Horta
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por leneoliveira às 12:18
Domingo, 15.09.13
Nem navio nem sombra de nuvem no mar
para um adeus da largada...
Esta saudade infinita
é uma ilusão que se disfarça.
Grita
que a dor passa!
- Saudade é voz ancorada...
Jorge Barbosa
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por leneoliveira às 12:18
Domingo, 15.09.13
A chuva, outra vez sobre as oliveiras.
Não sei por que voltou esta tarde
Se minha mãe já se foi embora,
Já não vem à varanda para a ver cair,
Já não levanta os olhos da costura
Para perguntar: Ouves?
Oiço, mãe, é outra vez a chuva,
A chuva sobre o teu rosto.
Eugénio de Andrade
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por leneoliveira às 12:17
Domingo, 15.09.13
Senhora Da Manhã Vitoriosa
Senhora da manhã vitoriosa
E também do crepúsculo vencido,
Ó Senhora da noite misteriosa
Por quem acordo, nas trevas, confundido.
Perfil de luz! Imagem religiosa!
Ó dor de amor! Ó sol e luar dorido!
Corpo, que é alma escrava e dolorosa,
Alma, que é corpo e redimedo.
Mulher perfeita em sonho e realidade.
Aparição divina da Saudade...
Ó Eva, toda em flor e deslumbrada!
Casamento da lágrima e do riso;
O céu e a terra, o inferno e o paraíso,
Beijo rezado e oração beijada.
Teixeira de Pascoais (
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por leneoliveira às 12:13
Domingo, 15.09.13
Recordação
Eu bem sei
Que rodo em muitas esferas
E não sei
Por onde me levas, poesia.
Quando vou,
E não encontro ninguém,
Tenho medo do que sei:
Um filho de sua mãe
E seu pai,
Ou algum longínquo avó,
A quem um poeta sai.
Será também o Deus da infância
E a árvore sagrada
De frutos proibidos,
Na fragrância
Com que rasguei meus vestidos
E não retirei os ninhos...
Enchi de rosas a terra
E levo nas mãos espinhos
Afonso Duarte (
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por leneoliveira às 12:12
Domingo, 15.09.13
Rosas e Cantigas
Eu hei-de despedir-me desta lida,
Rosas? - Árvores! hei-de abrir-vos covas
E deixar-vos ainda quando novas?
Eu posso lá morrer, terra florida!
A palavra de adeus é a mais sentida
Deste meu coração cheio de trovas...
Só bens me dê o céu! eu tenho provas
Que não há bem que pague o desta vida.
E os cravos, manjerico, e limonete,
Oh! que perfume dão às raparigas!
Que lindos são nos seios do corpete!
Como és, nuvem dos céus, água do mar,
Flores que eu trato, rosas e cantigas,
Cá, do outro mundo, me fareis voltar.
Afonso Duarte
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por leneoliveira às 12:12
Domingo, 15.09.13
Pétala de Rosa
Pétala de rosa! Olha,
Do velho poeta, não rias;
Guarda-a na folha
Do livro que se lê todos os dias.
Amor, não o sacies,
Não venhas a perdê-lo;
Põe pelo sinal um fio de cabelo
Na carta que me envies.
Foges-me da vida:
E na menina dos olhos,
Achada ou perdida,
Ali sempre te encontre, de sonho vestida.
Que importa o sol tão alto,
Que dê a luz do dia?
O sonho, seja irmão da loucura,
É o que dá poesia.
Afonso Duarte
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por leneoliveira às 12:11
Domingo, 15.09.13
Cantiga Dos Três Momentos
Ontem
os lírios brancos.
e nós dois no jardim.
Hoje
os bulbos dormindo,
a saudade sem fim.
Amanhã
das areias
talvez se erga uma voz:
Talvez
lírios de pedra
inda falem de nós...
Antonieta Borges Alves
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por leneoliveira às 12:09
Domingo, 15.09.13
DESEJOS VÃOS
Eu queria ser o Mar de altivo porte
Que ri e canta a vastidão imensa!
Eu queria ser a pedra que não pensa,
A pedra do caminho rude e forte!
Eu queria ser o Sol, a luz imensa,
O bom do que é humilde e não tem sorte!
Eu queria ser a árvore tosca e densa
Que ri do mundo vão e até da morte!
Mas o Mar também chora de tristeza…
As árvores também, como quem reza,
Abrem, aos Céus, os braços, como um crente!
E o Sol altivo e forte, ao fim de um dia,
Tem lágrimas de sangue na agonia!
E as pedras… essas… pisa-as toda a gente! …
Florbela Espanca
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por leneoliveira às 12:07
Domingo, 15.09.13
CANÇÃO DE ENGANAR A TRISTEZA
Se a tristeza um dia
Te encontrar triste sozinho
Trata bem dela
Porque a tristeza quer carinho
E fala sobre a beleza
Com tanta delicadeza
Por não ter nenhum carinho
Que ela só existe
Por não ter nenhum carinho
E dá-lhe um amor tão lindo
Que quando ela se for indo
Ela vá contente
De ter tido o teu carinho
Vinicius de Moraes (
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por leneoliveira às 12:06
Domingo, 15.09.13
POEMA DO REGRESSO
Quando eu voltar da terra do exílio e do silêncio,
não me tragam flores.
Tragam-me antes todos os orvalhos,
lágrimas de madrugadas que presenciam dramas.
Tragam-me a fome imensa de amor
e o queixume dos sexos túrgidos na noite constelada.
Tragam-me a noite longa de insônia
com mães chorando de braços vazios de filhos.
Quando eu voltar da terra do exílio e do silêncio,
Não, não me tragam flores...
Tragam-me apenas, isso, sim,
o último desejo dos heróis tombados ao amanhecer
com uma pedra sem asas na mão
e um fio de cólera a esgueirar-se dos olhos.
Joffre Rocha (
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por leneoliveira às 12:06
Domingo, 15.09.13
POEMA DE LONGE
Acendo um cigarro
e ponho-me a olhar
as casas que se elevam pela encosta…
Longe,
o Sol morre numa lagoa de sangue…
Entristeço-me.
Meus sonhos tornaram-se em nada,
minhas ambições nunca passaram de planos,
meus enlevos de amor nunca passaram de ânsias.
António Nunes
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por leneoliveira às 12:04
Domingo, 15.09.13
NOSTALGIA
Cinzento nicotina
serpenteia o meu quarto
argola o tempo que não passa
Tu não apareces
nada acontece….
O som sobe em 33 rotações
a voz sofrida de Ottis Reding
sustenta o calor de um canto soul
Emerges de uma nota de piano
por momentos bailas
na circunferência de uma bola de fumo
que se esquiva pela persiana
Fica o som dilatado do sax
a dar passagem a Ottis
a sentenciar “time is over”
Nada acontece…
Nicotino o espaço que se fecha
sobre mim sem ti.
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por leneoliveira às 12:03